Culpa
imprópria, também
conhecida como culpa por assimilação, por equiparação
ou por extensão,
é aquela em que o agente, incidindo sobre erro de tipo inescusável ou vencível,
supõe estar diante de uma causa de exclusão de ilicitude. Pratica ato, visando
à proteção de seu bem, ou seja, causa que justificaria, licitamente, um fato
típico. Um exemplo utilizado pelo jurista Damásio E. de Jesus figura de forma
apropriada para ilustrar este conceito: “(...)
suponha-se que o sujeito seria vítima de crime de furto em sua residência em
dias seguidos. Em determinada noite, arma-se com um revólver e se posta de
atalaia, à espera do ladrão. Vendo penetrar um vulto em seu jardim,
levianamente (imprudentemente e negligentemente) supõe tratar de um ladrão.
Acreditando estar agindo em legítima defesa de sua propriedade, atira na
direção do vulto, matando a vítima. Prova-se, posteriormente, que não se
tratava do ladrão contumaz, mas sim de terceiro inocente”. (Direito Penal –
parte geral-, 2003, página 304)
“Diz-se crime tentado, quando,
iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias a vontade do
autor” (art. 14, II do CP).
Esta é a definição da tentativa
que o legislador encontrou e positivou em nosso ordenamento jurídico penal. O
Código Penal Brasileiro adotou a teoria objetiva (formal) e exige que o autor
tenha realizado de maneira efetiva uma parte da própria conduta típica,
penetrando, assim, no núcleo do tipo. O conatus
opera quando o agente delituoso começa a execução de seu escopo criminoso e é
impedido de chegar ao resultado querido, por circunstâncias alheias a sua
vontade.
Uma situação muito importante a
ser refletida, e que será posteriormente analisada, é se a tentativa permite ou não sua
aplicação nos crimes culposos. A regra diz que não. Mas, boa parte da doutrina
encontra fundamento plausível de ser abordado por este artigo.
Juristas
como Damásio E. de Jesus, Paulo José da Costa Jr. e Ney Moura Teles, sustentam
a tese de que não há possibilidade de haver tentativa de crime culposo. Seguem
o entendimento de que não se configura a tentativa
sem a intenção criminosa e que o pressuposto essencial do conatus é o dolo, sendo, sem
ele, impossível ocorrer à tentativa.
O que
na verdade ocorre é que estes autores não sustentam a tese que figura a
existência da culpa imprópria,
ou seja, não a reconhecem como sendo uma exceção da regra. Acreditam que a culpa imprópria, na verdade,
não é uma espécie tradicional de culpa, mas, sim, um dolo disfarçado, ao qual,
por motivos de política criminal, o legislador resolveu punir como crimes
culposos.
Assim,
aquele exemplo apresentado outrora, em que o agente comete homicídio
acreditando estar em legítima defesa de sua propriedade, caso a vítima viesse
sobreviver, seria o autor indiciado por tentativa de homicídio doloso,
aplicando-se a pena de um homicídio culposo tentado. Essa é a solução
encontrada pela corrente contrária à tese da tentativa de crime culposo.
Neste
seguimento, juristas de grande prestígio como Fernando Capez, Edgard Magalhães
Noronha, Júlio Fabbrini Mirabete e Aníbal Bruno, compõe e sustentam este
outro lado divergente.
Conforme
analisado, a culpa imprópria
é uma ação que visa um resultado naturalístico, ludibriada por um erro de tipo
essencial inescusável ou vencível, em que o agente supõe estar diante de uma
exclusão de ilicitude. Neste caso, só sobrevive a culpa se o agente estiver
incidindo sobre erro, caso contrário haveria dolo e não culpa. Portando, a
culpa se configura logo no início, a partir daí, a ação é dolosa, mas refletida
sobre erro, que exclui o dolo e resiste à culpa, em face do aspecto normativo
do caput do art. 20
do CP.
Assim,
é o caso do “indivíduo, que,
caminhando à noite em estrada deserta, vê um vulto surgir à sua frente e sem
mais razão, julgando-se estar em perigo de vida e, portanto em legítima defesa,
dispara todo o seu revolver sobre ele, mas apenas o fere levemente”. (Crimes
Contra a Pessoa, Aníbal Bruno, 1978, página 128).
Com
fundamento no exemplo citado surgem algumas indagações importantes para a
análise em questão: é possível vislumbrar, neste exemplo, a presença da culpa imprópria? O agente foi
impedido por circunstancias alheias a sua vontade de chegar ao resultado
querido?
_Quanto
à primeira questão, diante de todo o enredo apresentado neste artigo, pode-se,
claramente, apreciar a presença do instituto da culpa imprópria, pois o agente estava recaído
sobre erro, pensando estar agindo em legítima defesa (putativa), quando na
realidade estava atacando um inocente.
_Quanto
à segunda questão, o aninus
do autor do delito, conforme todo o entrecho do caso fictício em rogo, era de
matar e não de lesionar. Sendo assim, pode-se dizer que o agente, realmente,
foi impedido por circunstâncias alheias a sua vontade de produzir o resultado
traçado, consequentemente, aparecendo à figura do conatus.
Assim
sendo, então, as duas respostas formuladas apontam a justificação que esta
corrente doutrinária defende. Neste último exemplo apresentado, houve culpa imprópria e, também,
existiu o conatus.
Fazendo uma fusão dessas duas respostas, podemos dizer que houve tentativa de
homicídio culposo. Em decorrência disto, sustenta esta corrente doutrinária a
possibilidade de poder haver crime culposo tentado.
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