Prevaricação imprópria ou especial
Breve atenção
sobre o novo art. 319-A, do Código Penal, que imputa ao servidor público crime
à conduta de omissão em não vedar o acesso de presos a equipamentos de
Prevaricação imprópria ou especial
(art. 319-A, do Código Penal): “Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente
público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico,
de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o
ambiente externo: Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.”
O tipo caçula do Código Penal
merece alguns momentos de atenção. Batizado de prevaricação imprópria porque o
funcionário age sem a necessidade de motivos particulares aos seus deveres,
difere da prevaricação própria do art. 319. Em seu elemento objetivo,
primeiramente o tipo abrange aparelhos telefônicos, podendo ser móveis ou
fixos, pois não faz ressalvas. Veda também o acesso do preso a rádios, que, no
sentido do texto, devem ser aparelhos de radiodifusão, quer sejam transceptores
(transmissores e receptores), apenas transmissores ou apenas receptores, mas,
obviamente, se excluindo rádios receptores de meios de comunicação (AM, FM, OC,
etc.).
E isso porque a exegese típica
demanda o impedimento à comunicação de presos com outros presos ou com o
ambiente externo, o que não significa incomunicabilidade do indivíduo ao mundo,
mesmo porque, é permitido o acesso a televisores e rádios receptores comerciais
em determinados estabelecimentos penais. Logo, o que deseja a norma é o
impedimento à intercomunicabilidade, ou seja, a transmissão de informações
entre pessoas. Diz a lei, ainda, sobre aparelhos similares, parecendo que se
refere a similares de rádios e não também a telefones.
Assim, poderiam se incluir
aparelhos tipo pagers, outros transmissores de ondas eletromagnéticas,
os Ipods, bluetooth e, em breve, os Iphones. O tipo não
fala em outros meios telemáticos, pelo que, o uso de computadores parece não
estar abrangido. Ou seria similar a rádio? E o vocábulo rádio usado no texto
legal foi aposto no sentido de aparelho material, coisa, ou no sentido de meio
transmissivo. Mas estaria incluído o uso de Internet mediante telefones,
eis que a vedação é o acesso a estes aparelhos e não sobre o modo técnico da
comunicação.
Ainda sobre computadores, com fio
ou wireless, poderia se argumentar que os dados ficariam gravados e
mesmo se apagados, poderiam ser desvendados mediante perícias. Porém o usuário
teria como usar códigos e cifras e mais ainda, o problema do segredo não
componente do tipo penal, mas responsabilidade do usuário, por sua conta e
risco. E o acesso a aparelhos telegráficos ou telex que funcionam como linhas
telefônicas? São aparelhos telefônicos ou similares a rádios? A questão toda
recai sobre a interpretação da lei penal, ampliativa ou restritiva, diante do
princípio da reserva legal e a tecnicidade do aparelho acessível, pelo que, não
se apresenta tão clara e resolutivo essa nova modalidade criminosa.
Denota-se que o espírito
legislativo foi impedir a comunicação entre presos ou destes com pessoas fora
do estabelecimento, não importando o assunto a ser tratado. Não obstante,
poderá acontecer o acesso e a comunicação entre presos e funcionários no
ambiente interno do estabelecimento com os aparelhos mencionados no artigo,
pelo que, também ao que consta, deve se afigurar atípica essa situação, pois a
lei é expressa ao vedar o acesso para comunicação entre presos e o ambiente
externo, e claramente, quem está no interior do presídio não está em ambiente
externo. Quid juris? Aflora mais um problema de interpretação legal. [1]
Como se proíbe o acesso aos aparelhos, não se exige o uso pelo indivíduo preso,
que é conseqüência (pos factum impunível). O elemento subjetivo do crime
é doloso, sendo a conduta omissiva própria (deixar), configurada na
inércia do servidor. A consumação ocorre com a omissão, ou seja, a permissão ao
acesso aos aparelhos pelo funcionário. Impossível será a tentativa, porque
crime omissivo puro.
[1] Sobre a interpretação
da lei penal, consulte-se: ORDEIG, Enrique G. Conceito e Método da Ciência
do Direito Penal. RT: SP, 2002.
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